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Democracia?

Por Marcelo Pereira

Etimologicamente a democracia seria o governo do povo. O povo elege alguns caras para representá-los no parlamento e decidir pelas coisas do cotidiano. Mas fico pensando se "demo" não é de "demônio" ao invés de "povo" em grego. Ou colocar "demagogia" no lugar, como nome de regime político. Não sei. Inverter valores virou moda nos últimos anos.

Vejam Apolônio Desgaster. Político tradicional do chamado baixo-clero, com quase 60 anos de idade, filho é neto de políticos, demonstra não ser muito bem um homem democrata. Sempre viu na carreira política um emprego e não uma representação cidadã. Aliás, um ótimo emprego, embora grande parte de sua renda vá na verdade aos empresários que ele representa de fato. Está em mais um mandato como deputado federal. Um influente deputado federal.

Apolônio é daqueles que acham que povo é somente a elite de grandes empresários e a classe média que o bajula. Entenda por classe média, todos os que não ganham 1 milhão de reais por mês, mas tem uma vida relativamente confortável, com amplo acesso aos mais modernos bens de consumo. Se acham os "homens de bem", embora de fato sejam "homens de bens". Quem estiver abaixo deles não presta, não interessa e se pudesse morrer seria um favor.

Apolônio obviamente apoiou o golpe. Ganancioso por convicção, se pudesse, teria o mundo a seus pés e todo o dinheiro do undo em sua conta bancária perdida em algum distante paraíso fiscal. Dizem que matou desafetos e ate ex-aliados, apenas por hesitação destes em apoiar o deputado. Era um cara que impunha respeito não por admiração, mas por medo mesmo. Ninguém queria virar churrasco nas mãos dos capangas de Apolônio. Aliás, outra lenda era que ele comia as vítimas mortas. Mais macabro impossível.

Mas a grande mídia televisiva, sempre gentil com crápulas do quilate de Apolônio, o convidou para uma entrevista em um canal que só passa... digamos... notícias. Bom, é o que este canal chama de "notícias". 

Num dos programas de maior audiência, Apolônio foi falar sobre - preparem-se para rir - democracia. O canal considerava Apolônio um estadista e escalou o jornalista mais prestigiado - e estranhamente o mais ranzinza - Canabarro Gante, para entrevistá-lo. Segue a entrevista, recheada de rasgamento de seda.

- Boa noite, estamos aqui com o excelentíssimo deputado Apolônio Desgaster, grande democrata, homem idônio e de conhecimento ilibado. Filho do grandioso Bento Desgaster e neto de Ebevenaldo Desgaster, grandes políticos em suas épocas. Apolônio falará conosco sobre o assunto que ele mais entende: democracia. Boa noite, Apolônio, que bom tê-lo aqui.

- A honra é minha, ainda mais que estou conversando com o impecável jornalista Canabarro Gante, que eu admiro muito e que é um homem seincero e que náo sabe mentir. Sempre mostrando a verdade dos gfatos em primira mão.

- Bom Apolônio: Wilma deposta, Duda preso e Partido dos Estivadores extinto. Finalmente atingimos a tão sonhada democracia. O que vem afinal?

- Agora é prepararmos para as eleições. Governar para este povão amigo, tão sofrido, que nos admira. Sem estes crápulas para nos ameaçar a gente pode finalmente governar em paz e fazer este país crescer.

- Você pretende renovar como deputado ou vai concorrer a outro cargo?

- Estou bem como deputado. assim tenho conseguido grades conquistas. O empresariado que me apoia, sempre sábio e altruista, me aconselhou a continuar no cargo. Eles estã preparando outro nome para o Poder Executivo.

- Mas sem Duda, temos a ameaça de um extremista, Adauto Ritário. 

- Sim, O cara é bom, concorda com a gente, mas é meio exagerado. Pode estragar os nossos planos. Mas para conquistar a opinião pública, deve ser um cara discreto, sem exageros. Sádico, entreguista, ganancioso, mas discreto e confiável.

- Verdade. Deixemos Ritário para lá. O que seu partido oferece de bom?

- Tentamos vários. Alcides Tração. Experiente, neto de políticos. Boa gente. Mas é meio fanfarrão. Pode passar imagem de irresponsável.

- Falaram que queriam um empresário apresentador. Muito conhecido nosso.

- O Carlos Tentação? Cara bom, tem boa imagem, transmite renovação. Mas sei lá porque motivo, ele desistiu. Parece que os empresários que apoiam nosso partido não querem ele. Sei lá. Vou averiguar.

- Há mais outra opção?

- Há um dono de loja de roupas, um tal de Marcos Tura. Cara bom, meu amigo e gosto dele. Mas ele foi se associar a um grupo neo-nazista. Isso me preocupa. Não que o nazismo fosse ruim, mas tem uma má imagem diante dos eleitores.

- Diante desses impasses, continua com candidato próprio ou vai apoiar outro.

- Nada disso. Vamos inistir com candidatura própria. Estamos preparando secretamente um Frankestein que pode muito bem ser um capitalista ganancioso, mas que pose de altruísta fazendo aquele assistencailismo barato que não mexe nos interesses dos pobres empresários. Não podemos dizer quem ele é agora. Quando chegar mais perto mostraremos.

- E a nossa democracia? Feliz em vê-la de volta, caro Apolônio?

- Ah, a democracia... Que bom ver os homens de bem usufruindo dela com plenitude. Sem aqueles macacos maltrapilhos querendo se intrometer...

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