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Copa de futebol, evento social

Por Marcelo Pereira

Goste ou não de futebol, vamos reconhecer: o que atrai multidões para o futebol não é o futebol, mas a capacidade incrível de agregação social que ele tem. 

Futebol une pessoas de diversas mentalidades porque foi consagrado como uma obrigação social. É como o Natal ou o ano novo em que goste ou não, você é intimado a estar envolvido. Os que se recusam tem que se isolar, comendo a poeira da solidão.

É óbvio, embora ninguém tenha a coragem de afirmar isso, que o futebol em si não tem características capazes de atrair multidões. Foi preciso criar "enxertos" no futebol para que ele pudesse atrair quase uma população inteira de um gigantesco país. 

O futebol é como uma amendoeira, uma árvore comum, de aparência insossa, nunca admirada pelas pessoas - embora seja uma excelente sombra para descanso. Você não acha uma amendoeira bonita. Mas decore-a com luzes, fitas coloridas, decorações natalinas e de repente ela se torna bonita. Você passa a admirar a amendoeira. O mesmo acontece com o futebol.

O que faz o futebol ser atraente são justamente os enxertos colocado nele. Há esportes bem mais divertidos do que futebol, mas muito menos populares. O Brasil tem uma seleção de basquete. Mas você viu o país parar durante o mais importante campeonato de basquetebol? Não! Porque basquete é chato? Não. Porque basquete não recebeu o enxerto cívico-social atribuído ao futebol.

A comparação com o Natal é boa porque nesta época de ano, o clima acaba contagiando a todos de uma forma que fica difícil escapar. Eu sou ateu, mas gosto do Natal. Não das lendas natalinas e muito menos das lendas sobre Jesus - que segundo indícios, não nasceu no Natal e sim na época atribuída à Páscoa - mas do clima de expectativa que a data sugere. Afinal, o Natal cai exatamente uma semana antes do ano-novo. É uma boa época para fazer retrospectivas sobre nossa vida.

Poderia gostar de copa, pelo clima de sociabilização. Mas não gosto de futebol. Futebol para mim, é um saco. Talvez gostasse de futebol se cada partida só durasse um minuto. Mas 90 minutos, com direito a prorrogações e fase de pênaltis é torturante demais para quem está de saco cheio do futebol. 

Além do futebol em si ser chato, há uma insistente apologia proselitista do futebol. Todos só falam de futebol, o tempo todo, de forma massiva e repetitiva.Além disso, torcedores são muito barulhentos. Futebol não é esporte para quem gosta de sossego e tranquilidade.

Ou seja, mesmo sendo um agregado social semelhante ao Natal, não dá para gostar de copa. Eu prefiro ficar ouvindo música no fone de ouvido enquanto os "normais" berram de forma ensandecida por causa de um gol que nada trará de positivo a sociedade brasileira. Desafio qualquer um a me provar que o fato da seleção brasileira ser pentacampeã ajudou o Brasil a se desenvolver e a ter dignidade, soberania e qualidade de vida. Não ajudou.

O Natal pelo menos estimula algum tipo de altruísmo, mesmo paliativo. Pobres ficam momentaneamente menos pobres nesta época de ano. É esmola, é engodo e mal dura um mês. Mas pelo menos ajuda a ensinar aos egoístas que é importante ajudar os outros. Mas infelizmente uma pessoa que mais ajudou os pobres está na cadeia sem motivos justos, para que possa ser impedido de ajudar mais pobres.

Voltando a copa de futebol, a analogia com o Natal é boa, embora na copa exista o entediante (para mim) futebol e toda a algazarra irritante que é inerente na época. A maioria das pessoa não gosta de futebol de fato - o pedantismo de vários "torcedores" é nítido - e na verdade só está nessa para não viver sozinho. O futebol não tem características que permitam unanimidade. 

O ser humano é um ser social. Para muitos, assumir o gosto, mesmo falso, pelo futebol, significa abrir portas para o emprego, para a vida afetiva e outros benefícios que dependam da decisão de outras pessoas para ser adquirido. Com numa discussão que eu tive anos atrás com um torcedor que queria que eu gostasse de futebol e que el acabou revelando que o verdadeiro motivo da adesão seria social. 

Pois ninguém gosta de futebol mas ninguém gosta de ficar sozinho. O futebol para muitos é o preço a pagar para se ter companhia. Um preço que sinceramente, eu não setou disposto a pagar. Mesmo que eu tenha que viver como um eremita durante 90 minutos. Mas 90 minutos passam. Dá para arrumar um jeito de não estar sozinho durante o resto do tempo, longe da bola rolando. Quem sabe, durante o Natal...

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