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A Solidão não é tão ruim assim

Por Marcelo Pereira

Vivemos em um tempo muito difícil. Além da correria para correr atrás do pão de cada dia, ainda vemos muitas injustiças e muitas exigências feitas muitas vezes sem necessidade. Essas coisas acabam por deixar as pessoas cada vez mais insensíveis, se tornando e fazendo outras pessoas infelizes em relação ao amor, sobretudo se fizeram escolhas erradas para uma vida a dois.

Sabem de uma coisa? A Solidão não é tão ruim assim. Como ela já é minha amiga íntima de longas estradas e minha companheira mais fiel, vou me referir a ela usando letra maiúscula.

Claro que eu preferia viver acompanhado, ainda mais num mundo que considera a vida a dois como sinônimo de felicidade (o que é um erro, comprovado por muitos casais infelizes) e que cultua o sexo o tempo todo. Mas as exigências abusivas que o sistema social me faz, os equivocados métodos de conquista, o excesso de mulheres comprometidas e o aparecimento de pretendentes indesejadas, acabam criando uma grande dificuldade e uma perda, não total, de esperança na vida afetiva. Não significa que não vá conhecer alguém decente um dia, mas significa que não há garantias em relação a isso e que não posso transformar a realização afetiva em uma meta. São maiores as chances de eu continuar sozinho.

Mas a Solidão tem o seu lado bom. A liberdade de não termos que ficar satisfazendo a vontade de uma outra pessoa, sobretudo se esta pessoa, além de ser exigente demais, gosta e pensa sobre coisas completamente diferentes de nós. Sozinhos, podemos controlar mais nossos gastos e nossas atividades com chances cada vez menores de se envolver numa dívida ou numa encrenca.

Sozinhos, podemos parar um pouco para nos conhecermos. Podemos tirar um tempinho para sentarmos em uma praia e olharmos o balanço do mar. Podemos ir ao terraço de um alto prédio e vermos como os carros e as pessoas parecem bem pequenos diante de nós. Podemos também numa noite olhar a lua e conversar um pouco com as estrelas.

Vocês já conversaram com as estrelas? Eu já, e uma estrelinha me ensinou muitas coisas importantes: uma delas se refere ao fato de que a imagem que vemos de uma estrela é uma imagem passada, graças a longa viagem que seu raio de luz percorre para chegar até aqui. Muitas vezes a estrela nem existe mais. Parece com as nossas vidas, quando esperamos que as pessoas que conhecemos na juventude mantenham as mesmas qualidades de quando as conhecemos e quando reencontramos, notamos uma diferença enorme, muitas vezes para pior. Doce estrelinha sábia, aprendi muito com isso.

Com a Solidão do nosso lado, podemos ir aos lugares que gostamos, se divertir da nossa maneira e comer o que gostamos sem ter que se preocupar se estamos mais gordos ou não. Sozinhos, podemos rir alto, sem que alguém mal humorado nos mande parar de rir.

Sozinhos, pensamos como nós mesmos. Ouvimos as músicas que gostamos e assistimos eventos esportivos que nos agradam, sem se submeter a preferência imposta pela mídia e pelos "amigos".

Sozinhos, vivemos com quem mais confiamos: nós mesmos. Não temos decepções, mágoas, pois não temos quem possa nos oferecer isso. Também sentimos mais seguros, porque não aparecerá ninguém para roubar nossas coisas e nossas vidas.

Sozinhos nos conhecemos melhor, pois conversamos com nós mesmos e passamos a conhecer alguém que nunca vamos conhecer em uma rotina de trabalho estressante ou no "stress positivo" das noitadas. Sempre tem algo novo a descobrir sobre essa pessoa que cada pessoa insiste em não conhecer: a própria pessoa.

Por isso estou preparado para viver só. Amadureci tarde e as chances que tive teimaram em não voltar mais. Hoje tenho quase 40 anos e por mais otimista que pareça, não dá para ter as mesmas oportunidades da juventude. A "idade das escolhas" acabou faz tempo.

Tenho muita possibilidade de viver acompanhado apenas da Solidão, essa companheira fiel e consoladora que nos conforta quando colocamos nossas cabeças no travesseiro para chorar.

Às vezes não gosto da Solidão, mas tenho que reconhecer: ela nunca me magoou. Nunca.

Por Marcelo Pereira, Niterói, 29 de junho de 2009

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