Por Marcelo Pereira
Tibúrcio odiava o Natal. Achava uma tolice toda a mitologia em torno do evento e detestava principalmente o Papai Noel. Achava ridículo um velho gordo (nas palavras de Tibúrcio) estar usando uma roupa calorenta em pleno verão brasileiro. Do Natal só gostava da ceia, já que era a oportunidade de comer pratos diferentes dos comidos no resto do ano.
Durante o amigo oculto (ou secreto, para os baianos), ocorrido no início do mês, a repartição onde Tibúrcio trabalhava, sorteou um dos funcionários para que fizesse o papel do Papai Noel numa das filiais da empresa. E sabe quem foi sorteado? Ninguém além de Tibúrcio.
Claro que Tibúrcio detestou. Mas o seu chefe disse que o sorteio era crucial e quem fosse o escolhido não poderia recusar a função. Mesmo contrariado, lá foi Tibúrcio "carregar a sua cruz".
De início, Tibúrcio demonstrava mau jeito no trato de sua função. Mas aos poucos foi sendo seduzido, não pela magia do Natal, que ele não acreditava, mas pelo carinho recebido pelas crianças que sentavam em seu colo e contavam seus sonhos. Comovido, mas ainda sem acreditar no mito natalino, resolveu por conta própria realizar os sonhos das crianças, por mais absurdos que fossem.
Distribuiu brinquedos e alimentos pagos com o próprio bolso e com ajudas de amigos e da esposa, que também trabalhava. Cadastrou país de crianças mais humildes que estivessem desempregados e ele mesmo pagou anúncios em Classificados. Quando podia, mandava os nomes destes para seu patrão avaliar. Fez também todo tipo de ajuda que lhe estava ao seu alcance.
As crianças, muitas deles acreditando na impossibilidade da realização de seus desejos, ficaram maravilhadas. Todas, sem exceção tiveram seus sonhos realizados, já que as que tinham pais desempregados puderam ver os mesmos sendo contratados por muitas empresas, muitas vezes com cada pai disputado por mais de uma. As que conseguiram brinquedos - os mais caros, em muitos casos - não acreditaram em ver seus desejos em suas mãos.
Encerrada a atividade de Papai Noel, Tibúrcio ficou aliviado, pois, apesar do amor recebido, era uma tarefa estafante. Depois de receber o pagamento extra de sua empresa pelo trabalho. Seguiu normalmente de carro até a sua casa, como todos os dias normais do ano quando foi parado por uma blitz. Uma blitz meio estranha, pois só ele foi parado.
Tibúrcio estava com o veículo em dia. Tributos pagos, carteira em dia, manutenção em dia, carro seguindo velocidade adequada e obedecendo todas as regras de trânsito e apenas seu material de trabalho no bagageiro. Tudo em ordem. mas porque ele foi parado, só ele?
Ao entrar no posto da polícia rodoviária, encontra um idoso gordo vestindo um caso de pelo vermelho e um óculos de aros finos. O velhinho falou que Tibúrcio foi chamado para estar ali. A sós, Tibúrcio e o velhinho conversavam:
- Senhor, o que estou fazendo aqui? Está tudo em ordem com meu carro e obedeci todas as regras de trânsito.
- Sei disso. O seu motivo de estar aqui é outro.
- E porque você está vestido desse jeito. Sei que é Natal, mas policiais rodoviários não precisam estar também vestidos como Papai Noel.
- Eu não sou policial. Estou aqui porque achei que era o melhor modo de te chamar até aqui. Meu nome é Nicolau e não moro aqui.
- Nicolau? Então você é o quê? O que faz na vida?
- O que eu faço na vida não te interessa. O que interessa é que estou aqui por gratidão.
- Hã?
- Você, sem acreditar no Natal soube traduzir o espirito natalino com mais perfeição do que muitos que acreditam, limitados a caridades menores. Você mudou a vida de muita gente!
- Puxa, quelegal. Mas continuo não acreditando no Natal.
- E nem deve acreditar. Natal é só uma convenção social. O que importa é que você acreditou nas pessoas.
- Puxa, me sinto feliz agora.
- Agora, vá para a sua casa. Sua família com certeza está lhe esperando para comer aquela ceia deliciosa cheia de coisas gostosas que você não tem a oportunidade de comer no resto do ano.
- Obrigado. Seja lá quem você for, Seu Nicolau, obrigado pelos elogios.
- Não há de quê. Seja feliz, de que modo for.
Tibúrcio entra no seu carro, após ser parabenizado alegremente pelos guardas rodoviários que o pararam e seguiu normalmente a sua casa, onde já encontrava sue família de braços abertos e arrumando a casa para a ceia noturna.
Seu Nicolau em seguida, se despediu dos guardas e sentou em uma estranha carruagem vermelha e ordenou às renas voadoras que seguissem em frente para o Polo Norte, partindo imediatamente. A missão foi cumprida.
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